quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Poemas de Carlos Robert Keis "Ô Chefe 45"


Era noite de festa em minha terra.

(Quanta saudade esta lembrança encerra!)

Regurgitava alegre a velha praça

Risonha e iluminada. A população

Tinha risos no olhar e no semblante,

Ostentando um prazer contagiante,

Uma alegria simples, leve e pura

Como uma onda suave de ternura

Que passasse envolvendo os corações.

As crianças em alegres explosões

De entusiasmo infantil tomavam parte

Naquela festa em que faltava a arte

Mas sobrava a alegria. Naquela idade,

Pondo no movimento a agilidade

E a força elástica do corpo, era

Como se fossem sóis de primavera

Ou andorinhas loucas a brincar

Na placidez balsâmica do ar.

As atenções eram voltadas, creio,

Para um mimoso, esplêndido torneio

De destreza infantil. Saltos, corridas,

Estranhas e magníficas partidas

Em que se disputava a primazia,

Numa renhida e cálida porfia...

De repente, porém, a multidão

Volta a sua volúvel atenção

Para uma vertical, esguia estaca,

Que no centro da praça se destaca,

Tendo na ponta um prêmio sedutor

A trumular dos ventos ao sabor.

É o pau de sebo: dizem. E, de fato,

Aquele poste até agora intacto,

Com o aspecto viscoso e reluzente

De monstruosa, elástica serpente,

Tem a polida superfície untada.

Começa agora a íngreme escalada.

Vários meninos ágeis, adestrados,

Ao poste liso, unidos, abraçados,

Tentam subir à ponta inacessível,

Ganhar o prêmio, próximo, visível,

Que, como um lenço baloiçando ao vento,

Parece dar-lhes ânimo e alento.

Quanto tempo perdido em tentativas!

Quanta vez, sob aclamações festivas,

Algum deles chegou perto do fim,

Sentiu ao seu alcance o galarim

Por que lutava... Era o mais forte,

Mais ágil, mais veloz ou de mais sorte:

Todos diziam, mas eis que desliza,

Volta ao solo e, de novo, a terra pisa.

Outro sobe na frente, glorioso...

Mas, o mesmo destino já o espera.

E o prêmio será sempre uma quimera,

Encantadora, esplêndida, doirada,

Ao ambicioso olhar da petizada...

Nós vivemos brincando de crianças

No pau de sebo - poste de esperanças

Com a felicidade lá na ponta -

E tentamos subir vezes sem conta,

Doidos, buscando essa ilusão falaz,

Mas deslizamos sempre para traz...

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De minha vida no áspero deserto

Passaram caravanas de ilusões,

Marchando a esmo, sob o céu aberto,

Como estranhas, fantásticas visões...

Tentavam repousar no abrigo incerto

Que a ventura constrói nos corações

- Esses oásis que se vêem perto

No lampejar das alucinações -

No meio delas, beduíno errante,

Com clarões de apoteose no semblante,

Ia a galope o príncipe Ideal...

Sublime e afoito como um sonho louco,

Fugia na distância, pouco a pouco,

Sumindo-se no abismo do areal.

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

Ano bom! Ano bom! Quanta esperança

Nessas ocas palavras seculares.

A humanidade é sempre uma criança

Que quer brinquedos simples e vulgares.

Há músicas festivas pelos ares.

Nos corações uma alegria mansa

Derrama risos no interior dos lares

Na previsão de um bem que não se alcança...

E a história se repete tantas vezes,

Que esses janeiros entre os doze meses

Hão de ser sempre os mais afortunados.

É o panorama eterno da existência:

Tudo esperar da infância e da inocência;

Nada querer dos túmulos fechados...

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