Renato Carbonari Ibelli
Os tambores estão rufando para a grande mordida do Leão. Ela acontece hoje, às 12h30, quando os cofres públicos estarão abarrotados com nada mais, nada menos, que R$ 1 trilhão saídos do bolso do contribuinte. A soma corresponde aos tributos arrecadados pelos governos federal, estaduais e municipais do início do ano até agora. O valor é estimado pelo Impostômetro, painel eletrônico que simula a arrecadação pública segundo a segundo. Nesse dia de mordida trilionária, a Associação Comercial de São Paulo (ACSP) realiza um evento no Pateo do Colégio, no centro da capital, para conscientizar a população da necessidade de cobrar dos governos o bom uso do dinheiro público.
Será a terceira vez – desde que a moeda brasileira passou a ser o Real – que a arrecadação chega à casa do trilhão. O mesmo ocorreu nos dois anos anteriores. Entretanto, a velocidade com a qual a cifra trilionária é alcançada vem aumentando consideravelmente.
Em 2009, por exemplo, o valor só foi atingido dia 14 de dezembro, ou seja, o Leão precisou de 49 dias a mais para abocanhar o mesmo tanto de agora. No ritmo atual, a projeção do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT) é que a arrecadação de tributos ao final deste ano chegue a R$ 1,2 trilhão – algo em torno de 35% do Produto Interno Bruto (PIB). A receita em 2009 foi de R$ 1,08 trilhão.
Alencar Burti, presidente da ACSP e da Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo (Facesp), lembra que "a diferença de mais de R$ 100 bilhões entre a arrecadação de 2010, comparada com a de 2009, equivaleria a três anos de recolhimento da extinta Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF)." Isso mostra que a desoneração não compromete a arrecadação, pelo contrário, a estimula, pois motiva o consumo. Outra prova dessa realidade se deu durante a crise financeira, quando o governo desonerou alguns produtos, como automóveis, do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), o que fez a arrecadação aumentar pelo crescimento do consumo.
Vale lembrar que os tributos interferem dramaticamente no preço dos bens e serviços. Ao comprar um pacote de açúcar, por exemplo, 32,33% do preço pago vai para o fisco na forma de impostos. O evento organizado pela ACSP no Pateo do Colégio tem como objetivo mostrar isso, evidenciando ao contribuinte que é do seu bolso que sai cada centavo que alimenta o Leão.
No local, estará montado o Feirão do Imposto, que revelará ao contribuinte o percentual de tributos embutido nos preços de produtos de uso cotidiano. Por lá também estará a Calculadora do Imposto, uma ferramenta irmã do Impostômetro que permite calcular o quanto os tributos comprometem os salários de cada brasileiro, como o quanto de impostos se paga nas compras feitas no supermercado.
Imposto.
O Impostômetro, que está instalado na sede da ACSP, também pode ser acompanhado pela internet, no endereço http://www.impostometro.org.br/ . No site, é possível dimensionar a evolução da arrecadação desde 2005 e o que o poder público poderia fazer com o montante arrecadado.
O Impostômetro foi lançado em ato público em 2005 após lideranças da Frente Brasileira Contra a Medida Provisória (MP) 232, como ACSP, o IBPT, o Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis no Estado de São Paulo (Sescon-SP) e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) derrubarem a MP. A iniciativa tem como objetivo mostrar o tamanho da carga tributária do País.
O desconhecido tributo de cada dia
Pesquisa indica que uma parte dos contribuintes só se lembra do IPTU como exemplo de imposto
Eliana Haberli
Cerca dois terços dos brasileiros (69%) declaram espontaneamente que pagam algum tipo de imposto. Mas, desses, 22,5% não conseguem citar pelo menos o nome de um. Uma parte (47,8%) só se lembra do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), o mais conhecido. Os dados são do levantamento Percepção da Política Fiscal Brasileira encomendada pela Escola Superior de Administração Fazendária (Esaf), do Ministério da Fazenda.
Depois do IPTU, o Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), com 25,4% de menção, é o segundo mais conhecido na pesquisa espontânea e, em terceiro, o Imposto de Renda (IR), com 25,3%. O percentual de indivíduos que paga impostos sobe de 69% para 84,9% na pesquisa estimulada, com os nomes dos tributos. Além disso, 14,9% declaram não pagar nenhum imposto.
Houve grande concordância na questão da quantidade de recursos que o governo usa para cumprir suas funções. Para 71,8% dos entrevistados, o governo arrecada o suficiente e as falhas acontecem por corrupção ou por falta de vontade política. Saúde e educação são as áreas mais carentes de recursos, na opinião dos entrevistados (72,1%). Onde o governo deveria gastar menos? Essa pergunta confundiu os entrevistados – 39,4% não conseguiu responder. Mas o senso crítico não deixou de aparecer: foram citados "salários de políticos, campanhas eleitorais, viagens, obras desnecessárias, corrupção e eventos de lazer". Maior controle sobre os gastos públicos faria o governo gastar melhor na opinião de 96,3%.
Quanto à opção de pagar mais impostos para ter melhores serviços, 42,6% concordariam. A maioria da população (94,4%) acha que é importante solicitar a nota fiscal nas compras, mas só 61,4% pede. Quanto à opção de pagar mais impostos para ter melhores serviços, 42,6% concordariam.
Foram ouvidas 2.016 pessoas. A palavra "impostos" foi usada em sentido amplo, no lugar do termo correto "tributos", para facilitar a comunicação com a população.
Mudança na relação fiscal
O tributarista Eurico Marcos Diniz de Santi, defende uma reformulação no relacionamento fisco-contribuinte.
Sílvia Pimentel
O Estado cria uma lei complexa, obriga o contribuinte a interpretá-la, fiscaliza e, caso entenda que a aplicação da legislação não é favorável aos cofres públicos, pune os contribuintes com a cobrança de multas altas. Essa é uma situação de insegurança jurídica comum no País. Para revertê-la, o coordenador do Núcleo de Estudos Fiscais da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV), o tributarista Eurico Marcos Diniz de Santi, defende uma reformulação no relacionamento fisco-contribuinte.
"O ideal seria o contribuinte informar o fato gerador do tributo ao fisco, que calcula os impostos devidos. Ou seja, é hora de devolver a complexidade tributária ao seu criador", explicou o tributarista, ontem, durante a reunião do Conselho de Altos Estudos de Finanças e Tributação (Caeft), da Associação Comercial de São Paulo (ACSP). Para Santi, há um consenso de que o sistema tributário é complexo, injusto, confuso, precisa de ajustes, mas a sua reformulação não sai do papel por falta de vontade política. A União, os estados e os municípios temem aprofundar o debate sobre a necessidade de reformar o sistema e, com isso, perder competência ou arrecadação.
"Os contribuintes são os únicos interessados na reforma tributária", ressaltou. Sobre a proposta inusitada de deixar o fisco interpretar a legislação para, depois, cobrar o imposto, o tributarista acha que o arranjo é viável e, se colocado em prática, reduziria custos para os contribuintes. Hoje, cada fisco tem suas próprias normas, fazendo com que o contribuinte seja disputado não só pelos estados, mas pela União e pelos municípios. "Os fiscos precisam se entender, sentar à mesa e harmonizar suas legislações, como ocorreu com a implantação do Simples", disse Santi, ao assinalar que a complexidade só traz benefícios ao fisco.
O tributarista defendeu a criação de um Conselho Nacional Fiscal, para discutir propostas para aperfeiçoar o sistema tributário e dar respostas aos contribuintes – a exemplo do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) –, e mais transparência no sistema tributário. "É um dever do Estado, que se esconde atrás da complexidade do sistema", concluiu o tributarista.
Fonte: Fenacon
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